Levantamento mostra que maioria das empresas não gera valor no Brasil por não conseguir rentabilizar acima do custo do dinheiro.
Nos dias 10 e 11 de dezembro o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central se reunirá pela última vez em 2024. Neste encontro, os nove integrantes do comitê irão decidir o percentual final da taxa básica de juros, a Selic, no ano. Com o estouro do teto da meta de inflação, espera-se um novo aumento de 11,25% ao ano para, no mínimo, 11,75% ao ano. O que deve trazer novos impactos para o mercado de crédito e para a economia.
A Selic é o principal meio utilizado pelo Banco Central para controlar a inflação. Também é uma taxa usada como referência para determinar os demais juros, como taxas de empréstimos e de aplicações financeiras. Com a taxa mais alta, os juros do país sobem, o que gera um custo mais elevado de dívida das empresas e dos cidadãos. Encarecendo investimentos e reduzindo o consumo.
No mercado financeiro, uma Selic mais alta deixa a moeda mais cara. O que torna as condições para comprar a prazo ou pedir financiamentos e empréstimos mais difíceis. O custo de vida mais elevado e o apetite pela bolsa de valores diminui. Também é impactada a taxa de câmbio, além de reduzir a demanda dos investidores por ativos de risco.
“Neste caso, na renda variável, o maior custo de dívida das empresas pode influenciar como investidores calculam o que seria o valor justo das ações das companhias listada. Diminuindo o apetite pela bolsa de valores”, afirma Flávio Málaga, sócio fundador da Málaga Assessoria em Finanças Corporativas e Contabilidade Societária.
A Málaga fez um estudo que mostra como a taxa de juros e o custo do capital nos patamares anunciados se tornam insustentáveis no mundo corporativo. “As empresas, em sua maioria, simplesmente não rentabilizam o capital em magnitude suficiente para ‘cobrir’ o custo do dinheiro nos níveis atuais e do futuro próximo. O que reduz os investimentos, a atração de capital produtivo, entre outros efeitos colaterais”, diz o especialista.
Málaga, que também é professor do MBA Executivo e do MBA Finanças do Insper, PhD em administração, explica em números o impacto da política de aumento da taxa Selic.
Entre as 261 empresas listadas na B3 e com liquidez, 75% delas (ou 196) obtiveram rentabilidade inferior a 13,5% ao ano em 2024. Considerando a taxa básica da economia (11,25%), sua trajetória ascendente e o prêmio de risco que deve ser somado a ela, o especialista afirma que a maioria das empresas não gera valor no Brasil, afirma.
“Simplesmente elas não possuem modelos de negócios fortes o suficiente para entregar uma rentabilidade acima do custo do dinheiro. Que, por sua vez, é função da percepção de risco do país e da expectativa de inflação”, afirma.
Segundo o levantamento, a rentabilidade média das 261 empresas foi de 7,76% ao ano, com 45 empresas gerando rentabilidade negativa. A mediana foi de 9,3%.
O aumento do custo do dinheiro também se reflete no valor das empresas: destas 261 empresas, reduziu de US$ 554 bilhões para US$ 406 bilhões. Uma queda de 27% em nove meses. Ou seja: US$ 148 bilhões em valor evaporaram do mercado de capitais em 2024.
“Esta perda de valor possui alta difusão: foi gerada por 228 empresas (87% das 261), ou seja, é um fenômeno sistêmico, decorrente da conjuntura. Ressalta-se que a taxa de juros não é causa, mas sim consequência de uma economia desestruturada. Cabe ao governo compreender as causas e atuar sobre elas”, pondera o especialista.