Em entrevista exclusiva, a secretária Selene Peres (Economia) explica o porquê do governo de Goiás ser contra a atual reforma tributária.
“O texto da reforma tributária é um Cavalo de Troia, ou seja, um presente de grego. Estão vendendo uma ideia que não é verdadeira e ela vai prejudicar extremamente os Estados do Centro-Oeste, Norte e Nordeste do Brasil”, diz a secretária de Estado da Economia, Selene Peres Nunes, em entrevista exclusiva ao EMPREENDER EM GOIÁS (EG).
Ela cita, entre outros pontos negativos, que a reforma está direcionada para tirar as competências dos Estados e municípios. Bem como vai aumentar a carga tributária do setor produtivo, sobretudo de alguns como serviços, extrativismo e agropecuária. Selene Peres vai além: afirma que o atual projeto em tramitação no Congresso Nacional não acabará com a sonegação fiscal e não fomentará o crescimento da economia.
“A reforma está sendo feita para beneficiar as grandes indústrias e as tradings”, diz. Frisa ainda que os países que adotaram o IVA tiveram crescimento econômico menor após a adoção do imposto.
A secretária prevê, inclusive, que se o texto da reforma tributária não sofrer alterações no Senado haverá um movimento de reconcentração dos parques industriais nos grandes centros consumidores. E também crescerá a desigualdade regional. Destaca ainda que, a oneração do setor de serviços restringirá o acesso já limitado da população em geral a serviços essenciais, como água e luz, cuja carga tributária terá elevação de 23,1%.
Segundo ela, muitas empresas fecharão as portas em Estados como Goiás e aumentará o desemprego de trabalhadores. Selene Nunes entende que o Brasil precisa de uma reforma tributária, mas que o texto em discussão amplia o “manicômio tributário”. Cita que, de cada R$ 1,00 arrecadado apenas R$ 0,39 estão sendo discutidos no projeto. Portanto, ela defende mais debates e revisões, inclusive, aplicar taxação sobre patrimônio e renda, como tem falado o governador Ronaldo Caiado. Confira a entrevista exclusiva.
Entre muitos pontos está a perda de arrecadação, pois a tributação será no destino da mercadoria. Quem ganha com isso será apenas os Estados mais populosos como São Paulo. Haverá, novamente, a concentração de grandes investimentos nesses Estados. Goiás, que tem política de incentivos tributários, sairá perdendo muito, pois a partir de 2032 ficará impedido de conceder os benefícios fiscais que garantem a atração de investimentos produtivos.
O texto da reforma tributária que tramita no Senado pode e deve ser modificado. Estamos fazendo um trabalho para mostrar aos senadores, ao setor produtivo e à população em geral que no atual texto há problemas sérios que vão prejudicar todas as populações de Goiás e dos Estados em desenvolvimento. Estudos mostram que, no ano passado, Goiás cresceu 6,6%. Mas, se aprovada a reforma tributária esta taxa cairá para 2,2%, este ano. São muitos pontos que precisam ser modificados. Hoje tem um diferencial de alíquota de 5% entre as regiões Centro-Oeste, Norte e Nordeste. Por que não acabar com isto? É um absurdo a concentração de toda a arrecadação de impostos no Conselho Federativo. Isso é um viés altamente centralizador.
Essa é uma premissa falsa. Goiás só tem a perder, e muito, com o atual texto da reforma tributária.
Não. O ICMS é um imposto em que o valor cobrado em uma etapa é compensado nas fases subsequentes, não se acumulando ao longo do processo produtivo. A reforma tributária apenas amplia o direito já previsto à apropriação de créditos para as mercadorias destinadas ao uso e consumo das empresas. Não é verdade que a alíquota será de 25%. Ela foi estimada em 28,04%, segundo nota técnica do Ipea. Já estudos do grupo técnico do Confaz estimam o tributo entre 33% e 40% antes das desonerações. Portanto, a alíquota do Brasil seria a maior do mundo, ultrapassando o IVA de 27% da Hungria
Não. Para desonerar a grande indústria e manter a arrecadação atual, outros setores sofrerão aumento da carga tributária. Os mais prejudicados serão os segmentos da agropecuária, extração mineral, indústrias de alimentos e de transformação, eletricidade, água, gás, esgoto e gestão de resíduos, construção, comércio, intermediação financeira e, principalmente, os serviços. No setor de serviços, os maiores perdedores são os de desenvolvimento de sistemas e outros serviços de informação, serviços jurídicos, contabilidade e consultoria, educação privada, transporte aéreo, obras de infraestrutura, serviços cinematográficos, música, rádio e televisão e os serviços imobiliários.
As grandes indústrias, multinacionais e tradings. As tradings se beneficiam pela prioridade na devolução de crédito tributário. O Centro de Cidadania Fiscal (CCIF), organização que elaborou a proposta original da PEC 45, é fortemente apoiada por agentes interessados na aprovação da reforma tributária.
Sim. Eles perderão a prerrogativa de legislar sobre seu imposto, conservando apenas competência para fixação de alíquota, ferindo o Pacto Federativo. Quem fará a administração e distribuição dos recursos será o Conselho Federativo, conforme o destino final do produto ou serviço, depois de compensados ou pagos os créditos.
A reforma tributária também acabará, a partir de 2032, com os incentivos fiscais concedidos pelos Estados. Vale lembrar que esses benefícios são importante ferramenta na promoção do desenvolvimento regional. Em Goiás, essa política garantiu a implantação e expansão de importantes polos industriais como o de Anápolis, de Aparecida de Goiânia, entre outros. O governo federal também tem a sua política de incentivo tributário. Porém, as regiões mais desenvolvidas do País recebem a maior parte dos recursos. O Centro-Oeste foi a menor destinatária das benesses federais no ano passado, ficando com apenas 9,8% dos recursos, contra 49% da região Sudeste. A região Norte ficou com 11,5%, a Nordeste com 13,5% e a Sul com 16,1%, conforme a LDO do Governo Federal.
Não. O sistema de operacionalização centralizada é muito complexo e ainda não existe. Isso coloca em risco a arrecadação estadual e municipal. E mais, a reforma não reduzirá a sonegação fiscal. Pelo novo texto, a cobrança do imposto no destino transfere para o varejo toda a arrecadação, o que dificulta o trabalho da fiscalização, que não está preparada para atuar no varejo. O aumento de alíquota e a coexistência de dois sistemas tributários estimularão a sonegação.
Começamos o ano com R$ 9,8 bilhões na conta única do Tesouro. Na conta do Estado temos cerca de R$ 11 bilhões. Mas, desse recurso tem de tirar a parte das transferências para os poderes Judiciário e Legislativo e os comprometidos com os restos a pagar. Deste montante, tem a vinculação dos recursos Fundo Estadual de Infraestrutura de R$ 1,1 bilhão este ano e R$ 1,2 bilhão em 2024.