BioUs desenvolveu composto que pode auxiliar no tratamento do câncer. Startup goiana recebeu R$ 200 mil em subvenções num ano.
Em menos de um ano de existência, a startup goiana BioUs alcançou mais de R$ 200 mil em subvenções (incentivos governamentais). É um feito e tanto para uma empresa que trabalha com pesquisa em biotecnologia, algo não muito usual nesse universo das startups. Ela é a única do Brasil selecionada no programa Hello, Tomorrow, da Apple TV+, e vem se destacando em outras seleções. Uma delas é Desafio Like a Boss, do Sebrae, no qual é finalista, ao lado de outras 23 candidatas.
Afinal, o que seus pesquisadores-empreendedores fazem de tão especial?
Raimundo Lima, fundador e CEO da empresa, explica: “Somos uma deep tech (startup baseada em investigação científica) que desenvolveu um processo biotecnológico simples e inovador para a produção do biopolímero PHA (polihidroxialcanoato). Utilizamos fontes renováveis, 100% biodegradável e biocompatível”, diz. A validação desse processo já permitiu produzir duas patentes internacionais da BioUs.
O PHA tem várias aplicações. A que pode ser mais revolucionária é no diagnóstico e tratamento do câncer. Ele funciona como um marcador biomolecular que permite, em exames avançados, identificar o local exato das células cancerígenas. E também para a entrega de drogas, no caso, medicamentos para o tratamento do câncer. “Consegue levar drogas e marcadores para qualquer célula. É como se fosse um cavalo de troia”, compara Raimundo. “É uma moeda energética fundamental para levar o marcador biomolecular”.
A pesquisa com o PHA começou em 2013, quando Raimundo era consultor de setor do agronegócio e desenvolveu uma biotecnologia aplicada na criação de peixes. Bactérias benéficas para melhorar a qualidade produzem o biopolímero a partir dos resíduos biológicos dos peixes. “Levamos o conceito básico de um processo biológico que ocorre no nosso próprio intestino, como uma bactéria do bem, estendendo esta mesma ferramenta, para o campo (bioinoculante), indústria (bioplástico) ou a saúde (nanopolímero). Pois estas bactérias do bem, acumulam reserva energética (PHA), como nós mesmos acumulamos glicogênio, por exemplo”, explica.
Na aplicação industrial, o trabalho de pesquisa da BioUs foi selecionado no programa de aceleração do grupo Ambev, que investe em startups de cunho social e ambiental. No caso, a startup goiana está trabalhando no desenvolvimento de embalagem circular.
“O biopolímero é um candidato a substituir o polipropileno, que é derivado do petróleo e altamente poluente”, informa Raimundo. O polipropileno demora até 400 anos para se biodegradar na natureza. Já o PHA leva 90 dias. “É um produto com diversas aplicações, desde embalagens até o diagnóstico e tratamento do câncer”, ressalta o CEO da startup.
Raimundo conta que a ciência entrou em sua vida em 1993, quando sua irmã ganhou ingressos de cinema e eles assistiram ao filme Jurassic Park. Ele ficou fascinado com o cientista do filme, que manipula o DNA dos dinossauros. Em 1998, sua mãe descobriu um câncer de mama aos 47 anos. Ele estava no ensino médio. Decidiu que queria fazer biomedicina para estudar o tratamento do câncer quando viu o laudo assinado pela biomédica mestra em biologia molecular Vera Saddi, que depois o orientou.
Raimundo se formou e em 2007 iniciou o mestrado em Biologia Molecular na UFG e fazia estágio no Hospital Araújo Jorge. Desde 2003, atuou em pesquisas com o amigo e depois sócio da startup Eduardo Rocha Pedrosa.
“Trabalhamos no Núcleo de Pesquisas Replicon, da PUC Goiás. Nosso time da BioUs foi formado no grupo de geneticistas que acompanha as vítimas do maior acidente radiológico urbano do mundo, o Césio 137 em Goiânia. Publicamos mais de 60 trabalhos científicos ao longo destes 20 anos de parceria”, diz.
Em 2013, descontente em relação à academia, Raimundo foi aceito como mentorado do pesquisador Tom Howard, nos EUA. Que, em 2016, o convidou para um programa de pesquisa de um ano na Escola de Medicina de Atlanta. Howard tem uma startup e esse período nos EUA mudou definitivamente a mentalidade do goiano. Que voltou para o Brasil decidido a não mais retornar à academia. “Eu vi outro mundo, o do empreendedorismo científico, muito diferente. Foi incrível ver startups incubadas na Escola de Medicina de Atlanta, o que não era comum aqui”, afirma.
O início, como startup de biotecnologia, foi difícil, praticamente não havia recursos disponíveis. Em 2019, Raimundo criou uma startup de consultoria, com o pesquisador Rafael Quirino. Depois de anos de pesquisa, finalmente eles descobriram o biopolímero. Em 2022, Raimundo e Eduardo criaram a BioUs.
O time tem três colaboradores: Iracema Brendler Friedrich de Castro Fonseca (Head of the Lab), Fausto Dias da Silveira, CAO (Chief of Agri Officer) e Fernando Alves Rosa e Silva, CMO (Chief of Microbiology Officer). Conta adicionalmente com três mentores internacionais, Prof. Dr. Rafael Quirino Ph.D (Georgia Southern University), Prof. Dr. Tom Howard (University of Texas/Haplogenomics) e Eric Aslakson, MSc (CDC/MIT), que são nossos mentores na área de química, medicina e inteligência artificial, respectivamente.
Leia também: Startups: 10 desafios para vingarem no mercado