sexta-feira, 26 de julho de 2024
‘Goiás vai perder R$ 170 bilhões em dez anos’

‘Goiás vai perder R$ 170 bilhões em dez anos’

Presidente do IMB, Erik Figueiredo explica como chegou a conclusão sobre as possíveis perdas para o Estado com a atual reforma tributária.

2 de setembro de 2023

Erik Figueiredo: “O setor de serviços terá um aumento expressivo de carga efetiva.”

O Produto Interno Bruto (PIB) de Goiás pode perder R$ 170 bilhões em dez anos com a reforma tributária. Pelo menos, como a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) tem tramitado no Congresso Nacional. É o que aponta um estudo feito pelo Instituto Mauro Borges de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (IMB).

Os pesquisadores utilizaram dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), divulgados pela ministra do Planejmento, Simone Tebet, às vésperas da aprovação do texto pela Câmara dos Deputados. A PEC tramita agora no Senado Federal.

Nesta entrevista ao EMPREENDER EM GOIÁS (EG), o economista e diretor-executivo do IMB, Erik Alencar de Figueiredo, fala sobre essa projeção, defende os incentivos fiscais como instrumentos para reduzir as desigualdades regionais e a situação de Goiás no cenário nacional.

Qual será o impacto da reforma tributária na economia goiana, especialmente no setor produtivo?

Nós estamos trabalhando no cálculo do impacto setorial nacional. Fomos a primeira instituição a calcular a alíquota, expor a metodologia e mostrar os dados, que são públicos, do IBGE. Nós usamos a estrutura das contas nacionais do IBGE para chegarmos a uma alíquota. Ao fazer isso de uma forma clara, nós conseguimos identificar os canais de majoração da alíquota, as exceções e dar peso a cada uma delas. Nosso próximo passo, que vamos divulgar, são os impactos setoriais. Há muita discussão sobre a alíquota nominal, 25%, 26%. Temos calculado a alíquota efetiva. O quanto pode chegar a arrecadação com a nova estrutura tributária no setor.

Por exemplo, para o leitor entender?

Quando vamos fazer o Imposto de Renda, a alíquota que temos em mente é de 27%, mas quando se preenche os dados e coloca exceções e despesas, tem-se a alíquota efetiva. A nominal é de 27% e a efetiva o quanto se paga realmente. Cai para 11%, 15%, dependendo do perfil. Estamos fazendo isso por setor para mostrar quais são e o peso deles em termos de geração de emprego, que acho que é o que mais importa.

Já têm alguma conclusão?

O setor de serviços terá um aumento expressivo de carga efetiva. Ele tem uma cadeia curta e terá menos créditos a serem descontados. Quando se fala que o setor de serviços paga pouco imposto, está olhando apenas o ISS, mas a carga de fato do setor de serviços é sobre a folha salarial, porque ele é muito intensivo de mão-de-obra. Em Goiás, ele corresponde a quase 60% de geração de riqueza, do PIB. E emprega muitas pessoas. Não estou dizendo que vai gerar demissões em massa, mas os setores considerados perdedores com a reforma empregam mais de 80% das pessoas do setor privado de Goiás. Isso corresponde a serviços construção civil e o agro, mesmo com a alíquota reduzida – que é 40% da alíquota nominal final – vai pagar mais impostos. Isso terá rebatimentos no carrinho de supermercado.

E a isenção da cesta básica?

Fala-se em uma cesta básica nacional, mas é um mistério os itens que vão compô-la. Há um impacto não negligenciável aí. Nosso estudo mostra de fato que setores terão aumento de carga efetiva. E os considerados ganhadores, como a indústria, não serão tão ganhadores, porque quanto mais se aumenta a alíquota, mais aumenta o fosso entre os perdedores e a benesse dos ganhadores. Estamos realmente preocupados com isso e muito voltados para esse trabalho. Mensurar isso não é fácil, há uma complexidade grande. Cada dia é um impacto novo.

Goiás é um estado voltado para o trabalho. Temos níveis de desenvolvimento diferentes. Ao colocar uma alíquota única, está igualando

Vocês têm estudos sobre o impacto sobre os incentivos fiscais e os fundos constitucionais?

Goiás tem 47% das pessoas trabalhando, tendo renda do trabalho formal e informal com alta renda. Quando se compara com o Brasil, chega a 42%, então estamos muito acima. No programa social, temos 19% frente a 26% do Brasil, de pessoas incluídas. Goiás é um estado voltado para o trabalho. Temos níveis de desenvolvimento diferentes. Ao colocar uma alíquota única, está igualando. A compensação teórica é que o Fundo de Desenvolvimento Regional seria direcionado para reduzir essas desigualdades. Mas temos de observar que esse fundo é uma coisa e o Fundo de Compensação por Perda de Arrecadação é outra.

A crítica é que os estados do Sul e do Sudeste estão pleiteando o Fundo de Desenvolvimento Regional, o que não faz sentido. Ele deveria seguir a mesma regra de distribuição dos fundos constitucionais atuais, das regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Primeiro atentando para a questão geográfica e em segundo lugar, tendo uma regra clara de distribuição no texto da PEC. Os fundos hoje são financiados em parte pelo IPI e em parte pelo IR pessoa física. Teria de saber quanto do ICBS será usado para o Fundo de Desenvolvimento Regional e qual o montante disto. Os fundos têm um caráter bem diferente dos benefícios fiscais.

Esses benefícios fiscais mudaram ao longo dos anos?

O perfil desses benefícios mudou bastante. O Fomentar/Produzir hoje tem uma concentração muito baixa de pequenas e médias empresas beneficiadas, apenas 10%. No Pro Goiás esse percentual aumenta para 50%, com regras mais claras. Temos os distritos industriais, fomos procurados nesta semana para melhorar os critérios de seleção. Esses fundos foram muito importantes para que as empresas atravessassem a crise do Covid. Tem um estudo no Ceará mostrando a importância dos benefícios fiscais para as empresas e mostra que eles aumentam a sobrevivência dessas empresas em aproximadamente 15%. Um espelho ao contrário pode mostrar que o fim dos benefícios devem reduzir a sobrevivência das empresas nesse patamar.

Em Goiás, os índices devem ser parecidos?

Temos alguns resultados mostrando que em Goiás, para a sobrevivência ao choque da Covid, foi nessa casa de 15%. Se não existissem esses benefícios, teríamos o fechamento de CNPJ muito maior.

Chegaram a alguma conclusão sobre o impacto real do fim dos benefícios fiscais para Goiás?

Temos muito cuidado em fazer previsões e isso nos diferencia. Trabalhamos com o factual. Esperamos que de fato algumas empresas tenham dificuldade em manter suas plantas em Goiás.

Atinge algum setor em especial?

Os fármacos preocupam bastante porque são um setor que terá aumento de alíquota com o IVA e tememos que a indústria farmacêutica migre. O gasto tributário federal é muito concentrado no Sul e no Sudeste, é concentrador de renda. 72% dos empréstimos do BNDES são para o Sul e o Sudeste. A única política descentralizadora, hoje, é a do benefício fiscal.

Então, o impacto será muito grande?

Estamos fazendo ainda, é trabalhoso e envolve informações sigilosas junto à Secretaria da Economia. Mas permite chegar à conclusão de que os benefícios são essenciais. Há outra ação silenciosa, que é de reduzir os custos para essas empresas de forma não fiscal, melhorando o ambiente de negócio, que é muito importante. Já tivemos melhoras, é mais simples contratar, demitir, negociar.

Quanto Goiás vai perder se a reforma for aprovada como está?

Não só Goiás. O texto atual, da forma como está, veio com absurdos que mostram que ele não foi discutido. Temos desoneração da cesta básica e cash back no mesmo texto. Se vai cobrar zero imposto, vai depositar zero na conta das pessoas? Da forma como está, é pouco operacional.

Mas há um valor?

O estudo do Ipea sobre impactos regionais, anunciado pela ministra Simone Tebet dois dias antes da votação, tem os impactos dos textos sobre os PIBs dos estados. PEC 110, queda do PIB de Goiás em quase 1% no acumulado de seis anos. PEC 45, a original, queda de 0,2%. Texto que chegou na porta da Câmara: queda de 0,7%. Pegamos esse estudo e a trajetória do PIB em Goiás, supondo que ele cresça 1,5% ao ano, bem conservador. Comparando esse 1,5% em anos com o projeto pelo Ipea e pegar as diferenças e somando todas essas perdas nominais, chegamos a R$ 170 bilhões de perda de PIB comparado com esse base line do crescimento natural da economia.

Nosso PIB de 2022 foi de R$ 272 bilhões, teríamos uma redução de R$ 170 bilhões em dez anos. Pequenas empresas podem encerrar atividades, menos consumo, menos crescimento de empregos. Estamos com uma trajetória de empregos muito forte. Até o meio do ano já criamos 80% dos empregos criados no ano passado inteiro, segundo o Caged. E o ano passado foi quando crescemos 6,9%. Então a reforma vem como um balde d’água.

Saiba mais: Reforma tributária: entenda o que deve mudar

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