sábado, 27 de abril de 2024
<strong>A utopia da moeda única</strong>

A utopia da moeda única

Uma moeda para ter credibilidade no mercado interno e externo tem que cumprir três funções específicas: meio de troca, reserva de valor e unidade de conta

25 de janeiro de 2023

A criação de uma moeda não é tarefa fácil como se imagina. Não basta apenas a reunião de dois ou mais líderes mundiais com o mesmo objetivo.

Nos últimos dias, tem se falado nos meios de comunicação sobre a possibilidade de criação de uma moeda única entre o Brasil e a Argentina, com a perspectiva desta nova unidade monetária vir a ser recepcionada também por países sul-americanos e latinos, caso específico da Venezuela, cujo presidente aprovou a ideia.

A criação de uma moeda única no âmbito de um Bloco Econômico, como o Mercosul, por exemplo,  só se verificará com o cumprimento de quatro etapas, sendo esse o mesmo caminho percorrido pela União Europeia. As etapas a serem vencidas são as seguintes: zona do livre comércio, união aduaneira, mercado comum, união econômica e monetária.

Para se ter ideia da complexidade desse papel, o Mercosul, criado em 26 de março de 1991, só consolidou a primeira etapa, ou seja, a zona de livre comércio.

Quando se atalha e não observa essas etapas, a moeda é criada de forma artificial, o que não corresponde às  expectativas. Uma moeda para ter credibilidade no mercado interno e externo tem que cumprir três funções específicas: meio de troca, reserva de valor e unidade de conta.

A hegemonia do dólar no mercado mundial, não se deu por acaso e, sim, por reunir as três funções, já nominadas. A presença americana nesse contexto, teve início após a Segunda Guerra Mundial. Naquela oportunidade, foram criados três organismos multilaterais: Banco Mundial, Fundo Monetário Internacional e o GAT (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio).

O dólar como moeda dominante passou a ser lastreada em ouro, recebendo a denominação de moeda papel. Isso a tornou muito valorizada no mercado mundial.
Se por um lado detinha a hegemonia no mercado cambial, por outro perdia mercado para outras economias no início da década de 1970.

A saída para a situação foi emitir moeda sem lastro, desvalorizando e com isso passando a competir em preços e qualidade no mercado americano e externo. A consequência dessa medida foi a transformação da moeda papel, em papel moeda ou moeda fiduciária, sem lastro. O que a levou a continuar sendo aceita no mundo foi a força econômica dos EUA.

O SUREAL, a princípio, seria utilizado apenas nas transações comerciais desses três países. O saldo positivo de cada um ao invés de produzir riquezas imporia perdas aos mesmos, uma vez que as reservas referentes a essas transações não teriam valor no mercado externo. Haja vista que trocaria o dólar por uma moeda sem valor comercial na aldeia global.

Os países latino-americanos passam por crises econômica e financeira. A inflação é uma realidade na Venezuela e Argentina, que fechou 2022 em 94,80%. Há 29 anos, o  Brasil tem uma economia estabilizada. No ano passado, fechou com uma taxa de inflação de 5,79%, um pouco acima do centro da meta.

A criação dessa moeda nesse momento colocaria em risco o processo de estabilização do país, além de outros indicadores econômicos, como o saldo das transações correntes.

Por essa e outras razões, a criação dessa moeda, no momento, seria uma utopia e traria perdas consideráveis para a economia brasileira.


Júlio Paschoal é economista e professor da UEG.
julioalfredorosa@gmail.com

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